Decisão da Justiça Federal pode quebrar a isonomia entre os candidatos no Exame de Ordem

Sexta, 14 de outubro de 2016

O Exame de Ordem tem seus defeitos, nós sabemos, mas é um processo seletivo dos mais importantes e, curiosamente, equânimes do Brasil.

Não tem vagas, não distingue entre classes, formação ou qualquer outro tipo de segregação. É uma prova feita para o candidato competir consigo mesmo: se está pronto, é aprovado, do contrário, fica para a próxima.

Ocorre três vezes ao ano, impedindo que o bacharel fique muito tempo encostado, sem tentar a própria sorte e definir o futuro.

E é, gostem ou não, uma prova séria, pois a preocupação com a igualdade entre os candidatos e a lisura do Exame é real. Afinal, a OAB coloca o próprio prestígio em jogo por conta do Exame. Não por acaso, Eduardo Cunha, em sua cruzada contra a OAB, atacou exatamente o Exame de Ordem.

Mas uma decisão da Justiça Federal do Mato Grosso do Sul pode por em risco a isonomia entre os candidatos.

O MPF ajuizou uma Ação Civil Pública contra a OAB questionando a limitação de tempo em apenas 1 hora para os candidatos portadores de deficiência, sob a alegação de que não cabe a OAB limitar o tempo extra deferido a esses candidatos.

O MPF alegou que o edital do XI Exame continha uma limitação do tempo extra, não estando em conformidade com o parágrafo 2º do artigo 40 do Decreto 3289/99. Este parágrafo confere aos candidatos com deficiência tempo extra para fazerem provas de concursos desde que um parecer médico especifique o tempo adicional que o candidato vai precisar.

A OAB se defendeu, aduzindo possuir liberdade pra definir o tempo, respeitando os parâmetros do decreto. A norma não conteria a previsão de tempo ilimitado aos candidatos nessas condições.

Apesar da ação ter sido ajuizada contra o edital do XI Exame, seus efeitos são válidos de agora em diante, ou seja, a Ordem tem de apelar para conseguir o efeito suspensivo. Ela ainda não foi intimada da sentença, mas o será em breve.

Sentença na ACP 0008081-04.2013.4.03.6000

E qual é o problema, exatamente, nesta decisão?

Fraudes e tentativas de fraudes são relativamente comuns no Exame de Ordem, assim como também são comuns em concursos públicos. No edital do XXI Exame, por exemplo, tivemos uma mudança derivada, exatamente, da ocorrência de fraudes na marcação dos post-its, ou seja, a famosa cola, que é uma fraude.

Isso sem contar fraudes mais sofisticadas, como pontos eletrônicos (sim, em todo o exame existem episódios com pontos eletrônicos).

O ponto é: o que impede que alguém pegue um atestado médico e consiga umas três ou quatro horas EXTRAS para fazer a prova SEM precisar?

Como a OAB vai controlar isso?

Alguém sem deficiência nenhuma pode SIMULAR ter algum problema e conseguir um bom tempo extra para fazer a prova.

Algum espírito mais inocente pode duvidar da capacidade de um médico em fornecer um atestado fraudulento, mas nós sabemos bem da existência de várias e várias fraudes com atestado médicos. Desde um simples atestado para se folgar um dia no trabalho a coisas bem piores. O mercado da picaretagem com atestados médicos existe e é GRANDE!

Fraudes em atestados médicos

Como a Ordem vai controlar e atestar a veracidade dos atestados por todo o país? Se a determinação do tempo extra ficar exclusivamente sob o controle dos médicos, sem uma junta da própria OAB (que teria de estar em cada localidade), as portas para trapaças ficam escancaradas. Sem a limitação do tempo extra (hoje de uma hora) candidatos desonestos terão o potencial de conseguir praticamente um tempo ilimitado para fazerem a prova.

Convenhamos, é muito melhor fazer uma prova da 2ª fase em oito horas do que em cinco. Sem pressa e sem a mesma pressão esses candidatos efetivamente teriam uma vantagem sensível em relação aos demais examinandos.

Se o tempo extra ficar ao critério dos médicos, sem fiscalização (é materialmente impossível fiscalizar), as portas para uma ampla quebra da isonomia (e fraudes) será aberta. Por detrás de uma decisão aparentemente benevolente a Justiça Federal e o MPF criaram um sério problema para a OAB e um fator de desigualdade entre os futuros examinandos.

Pior!

O gabarito oficial tanto das duas fases da OAB só é liberado quando TODAS as provas são entregues e todas são devidamente lacradas. Todas, no Brasil todo! Com essa decisão há o risco real da OAB só poder divulgar o gabarito oficial no dia seguinte ao da prova, deixando os candidatos na expectativa pelo gabarito de um dia para o outro.

As provas terminam sempre às 18h. A OAB leva mais ou menos uma hora e meia para divulgar o gabarito, ou seja, tem de esperar pela confirmação de que está tudo certo em todo o país. Se alguns candidatos (não precisam ser todos), ganharem três ou mesmo mais horas para fazer a prova, não é irreal pensar que o resultado só estaria pronto para ser divulgado lá pelas 22h.

Será que a OAB divulgaria ele neste horário? Pode ser que sim....pode ser que não.

Faltou razoabilidade na decisão da Justiça Federal.