A fatura da irresponsabilidade de décadas do MEC chegou!

Segunda, 17 de junho de 2019

A fatura da irresponsabilidade de décadas do MEC chegou!

Há poucos dias fomos surpreendidos com uma imagem que circulou pela internet de um jovem advogado em Brasília, com experiência jurídica, que estava parado ao loado de uma pista pedindo uma oportunidade de emprego.

A reação nas redes sociais fez sentido: ninguém nunca viu uma situação parecida com essa, ninguém nunca esperou que um advogado tivesse que apelar para este tipo de divulgação visando arranjar um emprego.

A culpa é do MEC

Mas por mais que fizesse sentido, há uma lógica terrível por detrás da iniciativa dele: o mercado da advocacia está inequivocamente saturado, e saturado já há muitos anos.

Curiosamente, ele foi contratado por uma empresa, e seu novo empregador se surpreendeu com o currículo dele:

?A gente entrou em contato com ele e o chamou para a entrevista. Ele tem um currículo muito bom, e era até estranho que alguém com aquela qualificação estivesse há tanto tempo desempregado. Ele vai atuar como assistente jurídico e já demonstrou estar bem-disposto?

Fonte: Metrópoles

O problema não era a qualificação e nem o preparo do profissional, mas sim o mercado.

O Brasil tem hoje 1.143.3433 Advogados. A expectativa é que chegamos a marca dos dois milhões de profissionais em 2027. Talvez essa marca seja atingida antes em razão da expansão absurda do número de faculdade de direito patrocinada pelo MEC.

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Só no ano passado o Brasil saiu de 1.423 faculdades de Direito para 1.562 instituções, em um salto absurdo de novas instituições.

De 2018 até o último dia 10 de abril deste ano, foram criadas 52 mil novas vagas em faculdades de Direito do país, autorizadas pelo Ministério da Educação. Com isso, o número de vagas foi elevado em 20%, totalizando 313 mil no país.

Fonte: 'É um estelionato com os alunos', diz vice da OAB sobre novos cursos de Direito

O MEC divulgou em 2018 o último Censo da Educação Superior, apresentado os dados até o ano de 2017 sobre as graduações, cursos de tecnólogos e licenciaturas.

O curso de Direito conseguiu manter sua expansão e se consolida ainda mais como a maior graduação do Brasil, com 879.234 ingressantes, seguido pelo curso de Pedagogia, Administração e, mais remotamente, Ciências Contábeis.

 

Os dados são referentes ao ano de 2017 mostram que temos no total 8.286.663 matrículas no ensino superior, sendo que Direito sozinho tem 879.234 alunos matriculados. Até 2013 o curso de administração dominava este ranking.

A obtenção da 1ª colocação é o resultado natural de mais de 2 décadas de expansão irrefreada dos cursos de Direito. Em algum momento isso iria refletir quantitativamente nas estatísticas e colocar o Direito como maior curso do Brasil.

Assim foi o aumento do número de instituições no país:

1995 ? 165 faculdades de Direito

2001 ? 505 faculdades de Direito

2014 ? 1.284 faculdades de Direito

2015 - 1.304 faculdades de Direito

2018 - 1.423 faculdades de Direito

2019 - 1.562 faculdades de Direito

O Blog Exame de Ordem acompanha a abertura de faculdades de Direito, que entrou em ebulição neste ano de 2018, e de uma forma absoutamente irresponsável: 

MEC autoriza mais 7 cursos e Brasil supera as 1400 faculdades de Direito

OAB/PR promete judicializar a abertura indiscriminada de cursos de Direito

Auditoria do TCU detona o MEC e a qualidade do ensino jurídico no Brasil

A escandalosa política do MEC: 104 cursos de Direito autorizados em 2018

A audiência pública do CNE e a ruína da graduação em Direito

Inacreditável! MEC autorizou hoje a abertura de mais 34 faculdades de Direito!

OAB bate pesado no MEC: "Contribui com a continuidade do estelionato educacional no Brasil"

A ostensiva guerra do MEC contra os Conselhos de Classe

A impressionante realidade do ensino superior privado no Brasil

Iniciada a era do desmonte do ensino superior no Brasil

A matemática resultante desta lógica é muito fácil de compreender: basta observar a média salarial praticada hoje para jovens Advogados, algo em torno de R$ 1200,00 a R$ 1500,00, como também observar os valores pagos para diligências nos mais diversos Tribunais do país, oscilando entre R$ 20,00 e R$ 50,00, afora o número significativo de advogados que estão arrancando o seu sustento exercendo atividades distantes do universo jurídico, para entender que a saturação não é uma mera suposição: ela é um fato manifesto e inequívoco.

Essa saturação já é objeto de denúncias aqui no Blog Exame de Ordem pelo menos há uns 8 anos, como também é objeto de reiteradas queixas da OAB neste mesmo período.

Por mais que a Ordem reclame, por mais que a OAB acuse o MEC de estelionato educacional, o Ministério não para de homologar as autorizações dadas pelo Conselho Nacional de Educação.

Para o MEC a questão educacional não guarda correlação com a questão do mercado: são duas coisas absolutamente distintas. Logo, a assimetria decorrente dessa visão explode nas ruas e explode nas mãos dos jovens advogados.

Um fato: o ministério não tem uma política educacional fundada em estudos e pesquisas. O Ministério age tão somente em atendimento às necessidades do empresariado da Educação.

Os últimos governos, desde Fernando Henrique Cardoso, são os responsáveis diretos por precarizar o ambiente da advocacia. Todos eles!

É uma situação extremamente complicada e sem uma perspectiva real de melhora. Na realidade, o aumento na quantidade de advogados é inevitável, dadas as autorizações de abertura de novas instituições jurídicas.

Essa conjuntura atinge especialmente os jovens advogados, sejam eles bem preparados ou não. Em um ambiente saturado, por mais que o advogado tenha talento, inteligência e capacidade, a perspectiva de se destacar se torna mais e mais complexa pela simples falta da existência de uma demanda de clientes, fracionados ao extremo em função da existência de centenas de milhares de concorrentes no mercado.

O MEC é responsável por esse quadro. O futuro da advocacia é o da saturação e do excesso de competidores, e não há nenhuma perspectiva real de isso mudar nos próximos anos.

Quem for se aventurar na advocacia precisa necessariamente pensar fora da Caixa, de enxergar mercados inovadores, adotar soluções criativas, adquirir metacompetências e de se preparar cada vez mais e mais.

Um fato: a OAB não tem forças para mudar essa realidade. Acompanho isso há tempo demais para ter algum tipo de dúvida quanto a isto. Por mais que a Ordem tenha lutado, ela não conseguiu frear abertura indiscriminada de cursos. E, infelizmente, a Ordem é a única entidade verdadeiramente preocupada com a qualidade do ensino jurídico.

O futuro na advocacia é para quem for imaginativo e pensar de forma diferente dos demais. O advogado "arroz com feijão" não tem mais vez no mercado.