Novo Código de Ética da OAB parece ser moderno, mas é apenas um instrumento forjado para o passado

Quinta, 5 de novembro de 2015

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A proposta do Novo Código de Ética nasceu tendo um mapa astral muito, mas muito ruim. Ela originariamente, simplesmente vedava o uso das redes sociais pelos advogados como instrumento de divulgação do trabalho profissional. A redação era tão ruim que já no primeiro dia de votação dela, ainda em abril, escrevi um texto repudiando-a:

A proposta do Novo Código de Ética da OAB e o risco de retrocesso no uso das redes sociais pelos advogados

E depois demos continuidade a essa luta:

Alô OAB, a jovem advocacia QUER a liberação da publicidade nas redes sociais!

O Dr. Jacques Veloso, presidente do Conselho Jovem da OAB/DF, gentilmente me convidou para debater o tema junto à jovem advocacia:

Jovens advogados começam a se insurgir contra as novas regras para publicidade do Código de Ética da OAB

Depois demos continuidade ao debate, sem deixar o tema cair no esquecimento, participando de uma série de eventos no sentido de tentar derrubar a proposta original:

Hangout: O Futuro do Mercado de Trabalho na Advocacia ? O impacto das novas regras de publicidade para advogados.?

Íntegra do hangout sobre a pretensão da OAB de vedar o uso das redes sociais por advogados

Hoje, a partir das 19h, a OAB/SC debaterá o Novo Código de Ética! Acompanhem ao vivo!

Mais um importante debate sobre a publicidade no Novo Código de Ética da OAB

Amanhã, em Maceió, um importante debate sobre a publicidade no Novo Código de Ética da OAB

Derivada desta pressão, a OAB apresentou um substitutivo da redação original:

Apresentado substitutivo parcial para a parte da publicidade no Novo Código de Ética

Por sorte, depois da luta de muitos, a redação original foi abandonada.

Mas, infelizmente, o que era péssimo apenas se transformou em algo ruim. O novo Código de Ética reflete tão somente uma visão elitista do mercado e ainda é um instrumento de restrição ao pleno exercício da profissão, revestido, como não poderia deixar de ser, do manto de uma pretensa visão ética.

O problema é simples: a visão de alguns sobre balizas éticas pode não ser a visão do todo, em especial daqueles que nasceram já na era da internet e hoje estão iniciando na profissão.

O que poderia ser mais vago e impreciso do que os dois artigos abaixo, por exemplo:

Art. 46. A publicidade veiculada pela internet ou por outros meios eletrônicos deverá observar as diretrizes estabelecidas neste capítulo.

Parágrafo único. A telefonia e a internet podem ser utilizadas como veículo de publicidade, inclusive para o envio de mensagens a destinatários certos, desde que estas não impliquem o oferecimento de serviços ou representem forma de captação de clientela.

Art. 47. As normas sobre publicidade profissional constantes deste capítulo poderão ser complementadas por outras que o Conselho Federal aprovar, observadas as diretrizes do presente Código.

Risível! O código nasceu com um buraco em seu bojo, incapaz de tratar do tema a que se propôs no início. Ou seja, o debate passou longe de ser devidamente esgotado. Qual o sentido de forjar um novo Código de Ética se ele não traz em seu corpo a explícita regulamentação sobre o comportamento nas redes sociais e internet, hoje os maiores canais de comunicação do mundo? A Ordem simplesmente não pensou na possibilidade da proposta original ser recusada.

A internet prepondera como instrumento de mídia e comunicação e quase tudo nela ficou dentro de uma zona cinzenta, sem uma abordagem específica. O que falar, por exemplo, do fato do Novo Código não tratar dos sites que oferecem serviços de correspondentes jurídicos por valores humilhantes, verdadeiramente de fome?

Ou mesmo, e o que é pior, como a OAB vai lidar com os vários (são muitos mesmo) sites de captação de clientela e leilão de serviços para advogados? Não percebem hoje que a maior ameaça aos jovens advogados está na internet?

Aliás, como ficará a FISCALIZAÇÃO dos captadores de clientela, que estão se espalhando como as 10 pragas do Egito pelo Facebook, Whastapp e outras redes? Eu não tenho notícia de algum site ou perfil no face ter sido derrubado por abusar de práticas contrárias ao atual código, agora repetidas no novo.

Será também que seria ético, só por amor à argumentação, montar sistemas de litigância de massa em que as petições são UNIFORMIZADAS e trabalhadas como se fossem parte de uma linha de montagem, onde pouquíssimos escritórios lidam com milhares e milhares de processos, concentrando absurdamente o mercado? A advocacia de massa nem de longe foi mencionada no novo código, como se o peticionamento robótico não pudesse ser alvo de uma perscrutação ética.

O novo código apenas parece ser moderno, mas mantém as estruturas de poder, e de mercado, intocáveis. Quem está no topo lá ficará, quem está na base terá até mais dificuldades em ascender.

É IMPORTANTÍSSIMO ressaltar: a mercantilização da profissão, pretensamente vedada pelo Código, existe e está cada vez mais sendo imposta garganta abaixo de todos. As punições são ínfimas e a fiscalização é, virtualmente, inexistente. Eu não consigo, de verdade, ver como útil a forma como o debate foi conduzido e muitíssimo menos ver como a realidade será alterada daqui em diante.

A internet mudou muito nos últimos 3 anos, e a OAB, como entidade de classe, está correndo o seríssimo risco de se tornar anacrônica diante da evolução das tecnologias, em especial daquelas que geram concentrações de mercado. Aplicativos, sistemas de gestão e sites são hoje as maiores ameaças aos jovens advogados, assim como a debilidade dos processos de fiscalização e a inutilidade das penas previstas na 8.906/94, lei que precisa de uma revisão URGENTE, porque está se tornando cada vez mais obsoleta.

Ou a OAB abre o olho ou ela começará a ser questionada pelos próprios advogados, que um dia vão se dar conta de que a Ordem mais atrapalha do que ajuda na hora de se buscar o ganha-pão. Aí, meus caros, a casa vai cair, porque as partes mais sensível do homem é o bolso, e o estômago também.