Montando o esqueleto da prova subjetiva da OAB

Segunda, 2 de julho de 2012

Em um passado não muito distante, os candidatos aprovados na segunda fase do Exame de Ordem tinham tempo para fazer o rascunho da prova e depois passar a limpo direitinho na folha de resposta.

Aliás, nesse tempo era possível inclusive consultar a doutrina e a jurisprudência durante a prova.

Eram tempos dourados e os candidatos não sabiam.

Hoje a história é outra: o candidato tem de pensar e escrever freneticamente para dar conta de todo o conteúdo.

É bem verdade que na última prova subjetiva não foi assim, mas nas provas dos Exames 2010.3 e 2010.2 a história foi dramática.

Muitos examinandos não conseguiram terminar a prova dentro das 5 horas disponibilizadas, dado o grande volume de informações a serem trabalhadas.

Não foram provas difíceis sob o ponto de vista técnico, mas sim extensas, cansativas. No V Exame Unificado as provas foram mais difíceis do que extensas. Tenho a impressão que se não fosse o problema das erratas o percentual de reprovação teria sido maior, pois a OAB, efetivamente (apesar dos pesares) aliviou a mão nas correções.

Mas montar um esqueleto para a prova não é só em função de substituir o hoje inexequível rascunho: o esqueleto pode assumir o importante papel de mapa, um passo-a-passo na prova.

O real papel do esqueleto é o de sistematizar os esforços do candidato, otimizando o tempo e dando segurança.

Um esqueleto bem concatenado dá muita tranquilidade ao candidato. Pode-se dizer inclusive que o real esforço intelectual estaria concentrado na construção do esqueleto. Depois, redigir a prova seria apenas um trabalho braçal decorrente do núcleo delimitado nesse rascunho da petição.

Como então montá-lo?

O papel do esqueleto é o de sistematizar, logo, o candidato tem de saber no que consiste a sua prova.

1 - Definindo a peça

A peça é o crânio da prova, a parte mais importante de tudo. Se o candidato erra a peça inevitavelmente reprovará.

Leia sua prova com calma, e determine qual a solução processual adequada: É uma inicial? Um recurso?

Ao definir a peça adequada, escreva na FOLHA DE RASCUNHO o nome da peça:

Peça cabível: Recurso X

Mas não basta só elencar a peça, seria simples demais e praticamente inútil como esqueleto. Delimite também os demais elementos constitutivos da qualificação da peça de forma a tornar a compreensão do todo bem clara:

Peça cabível: Recurso X

Juízo A Quo: Juízo da Vara W

Juízo Ad Quem: Tribunal Regional da Y Região

Recorrente: Fulano

Recorrido: Ciclano

Fundamento legal da peça : Art. 123 da CF c/c Art. 321 do Lei Z

Folha interposição de recurso endereçada ao juiz da causa? sim!

Escolhi deliberadamente acima uma estrutura de esqueleto referente ao um recurso. Vocês podem observar que a essência da peça foi delimitada, determinando a existência da folha de interposição do recurso, a competência, juízo a quo e ad quem, parte, fundamentos legais (declinar os fundamentos legais da peça é parte ESSENCIAL da prova. Sempre, sempre, sempre fundamentem com os dispositivos legais pertinentes) e, ao fim, a existência ou não da folha de interposição.

Vejam que na construção do esqueleto quase todo trabalho de pesquisa no vade mecum e de compreensão da problemática é realizado. Escrever na prova transforma-se quase que em um trabalho braçal.

Ao visualizar a estrutura da peça o candidato pode perceber com mais nitidez se falta algum detalhe ou informação pertinente. Isso é de extrema relevância: não deixar passar nada!

Mas a petição não é só feita de um "crânio" e sim do Direito Material controverso, a própria essência da petição.

Evidentemente, a estruturação dos tópicos da petição dependem do problema e de suas nuances: existem preliminares? Quantos tópicos controversos estão sendo exigidos na peça?

2 - Delimitando os tópicos

Essas são as duas principais perguntas a serem respondidas. De toda forma, pode-se apresentar um "modelo" de esqueleto para essa etapa da prova. Vamos conferir:

Tópico 1: Preliminar Q

Tese a ser combatida: Um tapa na cara não gera direito a indenização por danos morais (ao descrever a tese a ser combatida seja ultra, hiper, mega sucinto. É só uma orientação para si mesmo, nada além disso)

Fundamentos contra a tese a ser combatida: Art. 123 da Lei C, art. 321 da Lei U e Art. 231 da Lei Y + Súmula 123 do STF.

Conclusão: pelo provimento do recurso

Tópico 2: mérito - danos materiais

Tese a ser combatida: Danos decorrentes da colisão de veículo decorrem de culpa concorrente

Fundamentos contra a tese a ser combatida: Art. 123 da Lei S, art. 321 da Lei E + Súmula 321 do STJ.

Conclusão: pelo provimento do recurso

Observem alguns detalhes interessantes:

Os tópicos são divididos em 3 partes (tese a ser combatida, fundamentos contra a tese a ser combatida e conclusão). De um modo geral, cada tópico a ser trabalhado na prova pode ser construído em 3 parágrafos.

O primeiro (tese a ser combatida) carrega um pequeno resumo do ponto do enunciado referente ao tema. É a descrição da decisão a ser combatida.

O segundo é a SUA visão, como advogado, do que efetivamente deve ser, contendo as razões para a reforma do ponto de vista a ser combatido (no caso em tela, do juiz) e, o mais importante, os fundamentos legais e jurisprudenciais que justificam e embasam a reforma do decidido pelo juiz da causa.

Se o juiz disse "A", tal como você mostrou no 1º parágrafo,  no segundo você vai dizer "Não A" declinando as razões legais para o "Não A".

No terceiro parágrafo você reforça os argumentos do segundo parágrafo (apenas de leve) e requer a reforma da decisão do juízo a quo naquele tópico em específico.

Esse é um método de construção lógica do raciocínio que funciona perfeitamente dentro do Exame de Ordem. As ideias são dispostas de forma segmentada, sequencial e com clareza, sem firulas, enrolações e mistérios.

Vejam o problema e o espelho da prova de Direito Empresarial do V Unificado:

Percebem como o espelho da prova, em si mesmo, é um mapa? Estruturado, sequencial e lógico. Não é nem um pouco difícil projetá-lo mentalmente durante a realização da prova e, montando o esqueleto, apreender a sua possível futura estrutura.

Fica fácil para quem lê entender a linearidade e consistência do raciocínio do candidato ao se criar um esqueleto projetando o padrão do espelho. Ser compreendido pelo corretor da prova é tudo o que vocês podem querer na hora de serem corrigidos.

Construir o esqueleto dessa forma poupa tempo na hora de redigir de fato a petição. O candidato visualiza o todo e seus detalhes com mais clareza, consegue perceber eventuais falhas de raciocínio na hora da redação, e, acima de tudo, poupa tempo e reduz as margens para equívocos.

Cria-se um mapa a ser seguido, com segurança, sem atropelos e, principalmente, sem lapsos:

Por fim, o candidato, para completar o esqueleto, precisa fazer o seu pedido, e ele precisa ser completo, detalhando os pontos de Direito Material declinados no corpo da peça, pedindo o conhecimento e provimento dos tópicos, a intimação do recorrido e do MP (se for o caso).

Lembre-se: o esqueleto deve ser sempre sucinto, pois sua função é a de orientar o candidato. O esqueleto serve para organizar e detalhes os pontos importantes, só isso. Outros elementos da prova serão escritos na hora do candidato efetivamente escrever sua peça.

Colocar TODOS os detalhes nele representará uma imensa perda de tempo. Não é esse o objetivo...

3 - Considerações finais

Toda e qualquer metodologia a ser utilizada na hora da prova deve e precisa ser antes treinada. Deixar para fazer um esqueleto eficiente só na hora da prova pode dar um trabalho desnecessário ao candidato, tomando-lhe um tempo precioso.

O uso do esqueleto não é obrigatório e muito menos imprescindível. Fazendo um teste antes o candidato pode avaliar se compensa ou não adotar um para sua prova.

Aliás, não existe um modelo certo para elaborá-lo: cada candidato pode e deve fazer ao seu estilo, se assim achar adequado. O importante, de toda forma, é fazê-lo de forma sintética, com as informações relevantes e com uma boa celeridade, computando aí o tempo para a leitura do problema, a pesquisa das leis e da jurisprudência no vade mecum e o tempo para sua construção em si mesmo.

Para mim, um esqueleto construído com inteligência é muito útil: organiza a visão geral da petição e concentra grande parte da pesquisa e trabalho intelectual, tornando tudo bem claro na hora de redigir de fato a peça.

IMPORTANTE: Em hipótese alguma, repito, em hipótese ALGUMA façam um rascunho. Isso é sério!

Elaborar um rascunho é o caminho certo para a reprovação. Na prova passada uma amiga pediu para eu auxiliá-la no recurso. Sua peça tinha obtido uma nota altíssima, quase perfeita, mas suas questões estavam simplesmente desconexas, sem sentido. Não consegui entender de plano o porquê de tamanha discrepância de raciocínio. Questionei-a e ela confessou: havia feito um rascunho da peça e, quando foi partir para as questões, faltavam apenas 40 minutos de prova. Veio o desespero, a pressa e o resultado foi um só: reprovação!

Fico imaginando se ela tivesse feito um esqueleto, fazendo ainda assim uma peça boa, se bem que menos caprichada, e tivesse tido tempo de raciocinar e escrever as questões. Provavelmente hoje ela já estaria de posse da carteira.

A prova é um todo! A peça é muito importante, sem dúvida, mas as questões fazem parte do jogo e devem ser respondidas direito. O rascunho mata o tempo do candidato.

Isso é um fato!